Conversando com um grande amigo que trabalha em uma das mais importantes marcas de luxo no mundo me dei conta de que grandes transformações aconteceram nos últimos anos sem que muitos profissionais do turismo realmente se dessem conta delas.

E não estou falando dos clubes de assinaturas de viagens, que começaram com assinatura de livros e vinhos e viraram uma febre, tampouco da revolução na distribuição de todos os serviços turísticos, não apenas passagens e hotéis. Estou pensando realmente em mudanças importantes nos valores individuais dos consumidores.

Ele me comentou, fato esse que foi confirmado pela Associação Brasileira das Empresas de Luxo (Abrael), que os consumidores ricos chineses estão com medo de ostentar sua fortuna em função do alto número de pessoas na China que ainda passam fome. Tal comportamento é também observado na Europa e até mesmo nos EUA, terra dos self made men e women em que mostrar sucesso e sambar na cara da sociedade era, para as antigas gerações, fundamental.

Thiago Nigro, autor de bestsellers como “Primo Rico”, tem entrevistado grandes economias e alertado que será preciso repensar políticas econômicas para se evitar um possível e próximo colapso social. André Lara Resende, um dos pais do Plano Real, banqueiro e economista pelo MIT, também tem trazido importantes reflexões macroeconômicas lembrando que ideologias são inimigas do lucro. O maior estimulador do consumo no Brasil, o publicitário Nizan Guanaes, tem lembrado que o capitalismo é o melhor sistema econômico já inventado, mas que é preciso corrigir pequenas rotas para que ele não adoeça gravemente.

Não se trata do apocalipse nem do fim da economia do luxo, mas de uma importante revisão nos hábitos de consumo, no cuidado com o consumidor e o planeta. Mais do que tudo, mudança na produção e consumo dos bens de alto padrão e alto valor agregado. Fugir de um estilo old Money é a norma em todos os departamentos de marketing dos grandes conglomerados de luxo do planeta.

Serviços e bens de alto-padrão estabeleceram compromisso inabalável e fazem alarde com a sustentabilidade, a vida saudável e justificam os altíssimos preços cobrados pela excepcional qualidade e durabilidade secular do que produzem. Sim, a única ostentação possível é da saúde. Prova disso é que CEOs preferem ser vistos pela manhã em academias do que em clubes de charuto. Barrigas, cartolas e pince nez só em desenhos da Hanna-Barbera.

Os atuais bilionários norte-americanos e europeus passariam despercebidos em algum hotel, restaurante ou shopping center de classe média em uma cidade como São Paulo. Jeans, camiseta, malha e tênis é o uniforme de muitos passageiros da primeira classe das companhias aéreas.

Há hoteleiros que ainda usam luxury nos nomes de seus empreendimentos. Esses estão perdidos em algum lugar na década de 1980 e talvez se deem conta que estão na época errada ao ver que o filme Top Gun e todo o mundo daquela época envelheceu muito mal. Pouca gente sabe, mas é proibido o uso da palavra luxo dentro da Hermès. A mesma política se aplica no Relais & Châteaux.

Por outro lado, alguns destinos surpreendem. Ras Al Khaimah faz parte dos Emirados Árabes. Metade da oferta hoteleira é cinco estrelas: em sua comunicação vê-se muita natureza, jovens praticando esportes e liberdade. O Marrocos também rejuvenesceu sua comunicação, valorizando as experiências culturais, gastronomia e natureza. Nizan Guanaes, novamente ele, lembra que ostentar riqueza é cafona, resultado de graves problemas como baixa autoestima.

O consumidor AAA não precisa e nem quer aparecer. Ele tem horror de quem quer parecer sem ser. Quer pagar o valor justo pelo que recebe. Pensa a longo prazo e sabe que vai, se cuidar bem da saúde, viver muito. E, por isso, quer preservar o planeta.

O consumidor de alto padrão não quer mais se preocupar com a integridade de sua vida e de seus familiares e poder andar livre, sem se preocupar com segurança, somente quando estão 20 dias de férias em Gstaad ou Saint Barth. Há uma mudança importante no ar. Há compromisso social que precisa ser respeitado mais do que compromisso com complexo de inferioridade.

Novidades estão surgindo. Assim como novas tendências de consumo. E elas sempre começam no topo da pirâmide e passam longe do que era o consumo de luxo no passado. Mentes aguçadas já entenderam. O turismo vai continuar a ser um dos últimos setores a perceber?