A retomada do setor turístico tem contribuído positivamente com o mercado de seguros. Seja por precaução ou obrigatoriedade, milhares de consumidores viajantes valem-se das diferentes modalidades de contratação de seguro viagem e assistência viagens.Tanto que operadoras de seguro consolidadas no mercado há muitos anos, modernizaram seus serviços e passaram a integrar plataformas de open insurance, concorrendo com novas startups denominadas insurtechs.

Para realizar uma viagem é necessário pensar nas bagagens, roteiro, valores, vestuário e, principalmente, nos imprevistos, resguardando os bens mais preciosos como saúde. Para este último a contratação de um seguro viagem resguarda a assistência médica emergencial, custos com internação, inclusive, em países onde o sistema de saúde não é prestado, como nos EUA.

O seguro viagem garante ao segurado indenização na ocorrência de sinistros cujos riscos estejam cobertos durante o período de viagem, cuja cobertura inicia-se no embarque, permanência e retorno.

A contratação de seguro viagem ofertadas obrigatoriamente, conforme Resolução 315/ 2014 do Conselho Nacional de Seguros Privados, são: despesas médicas, hospitalares e/ou odontológicas em viagem nacional e internacional, traslado de corpo, regresso sanitário, traslado médico, morte em viagem, morte acidental em viagem e invalidez permanente total ou parcial por acidente em viagem – sendo algumas dela de contratação obrigatórias para viagens internacionais.

A partir do momento que uma pessoa viaja, acidentes ou infortúnios podem ocorrer, havendo a necessidade de intervenção médica de emergência, por exemplo, em um pronto atendimento.

No entanto, o que muitos segurados ignoram é que diversos países detêm seu próprio sistema de saúde e, por óbvio, suas próprias regras. No caso dos EUA, onde o sistema de saúde é totalmente privado, uma consulta prévia para avaliação e pedidos de exames não sai por menos de US$ 400, ou seja, o equivalente hoje a R$ 2.021,44.

Esta é uma das razões pelas quais alguns países exigem o seguro viagem de forma obrigatória. Isso porque, caso não haja esta exigência, os custos médicos não seriam pagos pelos viajantes estrangeiros, ocasionando prejuízos às redes hospitalares e, consequentemente, onerariam os segurados locais.

E pensando em sua própria população segurada, bem como na responsabilidade com os turistas durante a estadia no país, que o rol de países que exigem a contratação de seguro-viagem obrigatório aumentou.

O seguro viagem obrigatório aos viajantes dos países signatários do Tratado de Schengen, assinado em 1985, facilitou o trânsito de estrangeiros e burocracias regulamentares entre fronteiras.

Ademais, não apenas os países signatários do tratado exigem a contratação do seguro, como alguns Europeus, sendo exigência inclusive de Cuba, Argentina, Chile, Uruguai e Cabo Verde.

Sucede que o seguro viagem, como qualquer outra modalidade de seguro, contempla um rol de coberturas e também dos riscos não cobertos. A Superintendência de Seguros Privados define que esses riscos excluídos “são eventos danosos, elencados no contrato, mas não contemplados pelo seguro, ou seja, em caso de ocorrência, causando danos aos segurados (ou a sua responsabilização, pelos mesmos, no Seguro de Responsabilidade Civil), não haveria indenização ao segurado”.

A relação entre Segurado e Seguradora é regida pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), e sobre ela todos os players envolvidos no fornecimento e na prestação de serviços respondem solidariamente na ocorrência de prejuízos, contudo, essa responsabilidade não é absoluta e sim limitada na ocorrência de determinados fatos, chamados de excludentes.

Um exemplo de excludente é a constatação de doenças preexistentes, as quais quebram o liame de responsabilidade da seguradora e a eximem do pagamento de indenizações ou custeio de tratamentos integrais, seja em solo brasileiro ou durante a viagem. Para fazer valer essa regra, nos termos da Súmula 609 do Superior Tribunal de Justiça, a seguradora deve exigir exames
médicos previamente a contratação.

Na esteira da boa-fé contratual, caso a informação sobre doenças preexistentes seja sonegada ou alterada no momento da contratação, havendo a correta solicitação pela seguradora, afasta-se o dever de cobertura e não configura ato ilícito passível de indenização.

Nesse sentido, estende-se o entendimento sumular à omissão na contratação do seguro em caso de doença preexistente, no caso de sinistro morte ocorrido durante viagem, não sendo cabível a indenização.

Outro tema importante são as limitações das coberturas contratadas, pois o seguro-viagem compreende obrigatoriamente despesas médico-hospitalares limitadas ao tratamento de urgência ou emergências que o segurado venha a se encontrar, perdurando até a estabilidade para continuidade da viagem ou retorno à sua origem.

Desta forma, a continuidade do tratamento quando do retorno ao local de residência, salvo disposição contratual expressa em contrário, não pode ser interpretada como responsabilidade da Seguradora, inexistindo ilegalidade ou abusividade em cláusula contratual limitadora.

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO VIAGEM. AUTORA QUE SOFREU UMA QUEDA NO METRÔ DE PARIS, UM DIA ANTES DO RETORNO AO BRASIL, TENDO FRATURADO O PUNHO ESQUERDO. ATENDIMENTO MÉDICO DEVIDAMENTE REALIZADO NO EXTERIOR CUSTEADO PELA SEGURADORA RECORRIDA. ALTA MÉDICA REALIZADA ALGUMAS HORAS ANTES DO VOO DE RETORNO. CIÊNCIA DA VIAGEM PELO MÉDICO LOCAL, QUE, APÓS A REALIZAÇÃO DE EXAMES CLÍNICOS E DE RADIOGRAFIA, IMOBILIZOU O BRAÇO DA SEGURADA E RECOMENDOU CONSULTA COM CIRURGIÃO NO PAÍS DE RESIDÊNCIA. CONTINUIDADE DO TRATAMENTO MÉDICO REALIZADO NO BRASIL. EXCLUSÃO DE COBERTURA. CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO DESPROVIDO.

As relações comerciais de consumo estabelecidas e que permitem o desenvolvimento da atividade empresarial, seja na área de seguros, seja no turismo, respeita os limites impostos pela boa-fé objetiva, norteados pelos princípios da transparência e livre contratação.

O risco assumido pelas seguradoras é calculado atuarialmente e assim, como atividade com fins lucrativos, impinge limites de cobertura contratualmente previstos e que se respeitados as resoluções do Conselho Nacional de Seguros Privados não desrespeitam normas protetivas de direito do consumidor.

Texto por: Jayme Barbosa Lima Netto – Mestrando em Direito dos Negócios pela FGV, MBA em Gestão Empresarial pela FGV, advogado e sócio da Lee, Brock,Camargo Advogados.

Marilia Poggio Nunes Ribeiro, advogada, sócia da LBCA, atuante no contencioso cível e consumidor. Formada pela Universidade Paulista, MBA em Gestão Empresarial e Business Law pela FGV, em andamento.

Marina Spagnolo Iliadis é advogada, sócia da Lee Brock Camargo Advogados, atuante no contencioso cível e consumidor. É especialista em Contratos pela PUC-SP e possui curso de extensão em Processo Civil pela FGV.

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