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Uma diária de hotel deve significar 24 horas corridas ou 24 horas de segurança e conforto garantido?

Texto por Orlando de Souza, presidente executivo do FOHB e Leonardo Volpatti, da Volpatti Advogados e Associados

Nas últimas semanas, voltou ao debate público o tema da duração da diária hoteleira, a partir da tramitação, em Minas Gerais, do Projeto de Lei nº 3.788/2025, que pretende fixar a diária em 24 horas corridas, das 12h de um dia às 12h do dia seguinte. Mas afinal: reduzir o tempo efetivo de uso do quarto prejudica o consumidor?

A resposta exige menos paixão e mais racionalidade.

O tempo de preparo como garantia de qualidade

Em diversos setores, há tempos técnicos de preparo que o consumidor não vê, mas que são essenciais para a qualidade e a segurança do produto final.

  • No setor aéreo, a aeronave não sai imediatamente após o pouso: há inspeção, reabastecimento e limpeza.
  • Nos restaurantes, a cozinha abre antes do salão, porque há mise en place, higienização e preparo dos ingredientes.
  • Em hospitais, os quartos precisam de um intervalo entre altas e novas internações para esterilização e troca de enxovais.

Na hotelaria não é diferente. Entre o check-out e o check-in, existe um esforço intenso e invisível: camareiras recolhem roupas de cama e banho, que seguem para lavanderias industriais; os quartos são higienizados, móveis revisados, frigobar reposto, banheiros sanitizados com produtos adequados. É esse intervalo que garante ao hóspede seguinte um ambiente limpo, seguro e confortável.

A falácia das 24 horas corridas

Fixar por lei que a diária deve ter exatamente 24 horas corridas é uma inoperância prática. Se cada hóspede tivesse direito a permanecer exatamente 24 horas no quarto, não haveria tempo hábil para esse processo de limpeza e higienização.

Resultado?

  1. Prejuízo ao consumidor, que encontraria quartos sem a devida assepsia ou com a assepsia ideal para os padrões de segurança sanitária.
  2. Aumento do custo da hospedagem, já que os hotéis precisariam contratar mais pessoal, criar uma operação escalonada e ampliar sua estrutura apenas para manter o giro. Ex: O hóspede entra 12 horas e sai às 12 horas do dia seguinte. Logo, o próximo hóspede entraria às 14hrs e sairia às 14hrs do dia seguinte e assim sucessivamente? Ou será que para vender uma diária, o hotel deveria perder a próxima diária para dar tempo de fazer a limpeza adequadamente e atender o critério de 24hrs ininterruptas? Como consequência prática, provavelmente os preços da diária dobrariam de valor.
  3. O que se observa nos grandes destinos internacionais é que os horários de check-in e check-out não são fixados por lei, mas por padrões de mercado e regras contratuais claras. Essa prática confere previsibilidade tanto ao consumidor quanto ao prestador de serviços. A uniformização se dá por meio de autorregulação do setor, guias de boas práticas e parâmetros internacionais de hospitalidade, e não pela criação de normas estaduais fragmentadas. A tentativa mineira, nesse sentido, caminha na contramão do que é feito no turismo global, onde a prioridade é oferecer transparência ao cliente sem engessar a operação dos hotéis.

A questão constitucional

Além de ineficaz, a proposta é inconstitucional. A Constituição Federal (art. 22, I) atribui à União a competência privativa para legislar sobre direito civil (contratos, como o de hospedagem) e sobre turismo.

Mais que isso, a Lei Geral do Turismo (Lei nº 11.771/2008, alterada pela Lei nº 14.978/2024) já estabeleceu a diária de 24 horas, delegando ao Ministério do Turismo a regulamentação do tempo destinado à limpeza. O Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.717.111/SP) validou a prática de reservar algumas horas para higienização, desde que previamente informada ao consumidor.

O Supremo Tribunal Federal, em casos semelhantes (como as ADIs 6441, 7023 e 7208), já declarou inconstitucionais leis estaduais que criaram regras contratuais em setores de alcance nacional, reafirmando a competência exclusiva da União.

Conclusão

Exigir por lei que a diária hoteleira seja de 24 horas corridas não é apenas um equívoco jurídico: é uma ameaça à segurança sanitária, um risco de elevação de custos para o consumidor e mais uma jabuticaba regulatória que distancia o Brasil das boas práticas internacionais.

Se o país deseja competir globalmente em turismo e hospitalidade, o caminho é o oposto: segurança jurídica, regras federais unificadas e liberdade contratual clara e transparente. Criar normas estaduais conflitantes é apenas um desserviço à política nacional de turismo.

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