Conhecida por sua resiliência e adaptabilidade, a indústria do Turismo tem enfrentado um período de adversidades sem precedentes em todo o mundo. Mesmo após a inédita e impactante pandemia de Covid-19, o setor se viu obrigado a continuar se adaptando às calamidades, sejam elas por causas humanas ou naturais. Os recentes incêndios florestais na Argentina, os ciclones no Rio Grande do Sul, a estiagem extrema no Amazonas, o terremoto no Marrocos e os conflitos na Ucrânia, Israel e Palestina, têm desafiado a capacidade de recuperação do setor.
Levantamento da Confederação Nacional de Municípios (CNM) revelou que o Brasil registrou mais de 3,3 mil decretos de situação de emergência ou calamidade até o mês de setembro de 2023. Ao todo, são mais de 5,8 milhões de brasileiros diretamente afetados por essas adversidades. O relatório inclui vendavais, deslizamentos, fortes chuvas, inundações e, principalmente, secas e estiagens, fenômenos que estão cada vez mais recorrentes e devastadores nos últimos anos, segundo a entidade responsável pela pesquisa.
Vale salientar que esses desastres não afetam apenas as populações locais, mas toda a economia da região, impactando os mais variados tipos de empreendimentos, em especial os turísticos. É o caso da agência de viagens Poranduba Amazônia, que foi obrigada a suspender as operações em comunidades parceiras no baixo Rio Negro e buscar parcerias com empreendimentos que não foram afetados. “Foi um impacto significativo, praticamente dois meses e meio com tudo parado”, conta Bruno Mangolini, proprietário da empresa.
“Não temos muitas opções além de tentar trazer atenção ao tema por meio das redes sociais, relatando como isso afeta as populações, o abastecimento e o deslocamento das comunidades da região. Estamos reforçando que esse tipo de tragédia é recorrente, mas que todo o ano está cada vez mais extremo, em função das mudanças climáticas ao redor do mundo”, afirma Mangolini. “Em uma escala maior, os empreendimentos suspendem as operações, impactando o faturamento, e os governos arrecadam menos impostos”, acrescenta.
Para se ter uma ideia do impacto na economia, o relatório da CNM aponta que as perdas causadas por desastres naturais nos municípios brasileiros, ocorridos entre os anos de 2013 e 2023, totalizaram R$ 401,3 bilhões. Só até agosto deste ano, o prejuízo financeiro foi calculado em R$ 50,5 bilhões, número consideravelmente superior aos resultados dos últimos anos. Em 2020, as perdas foram de R$ 15 bilhões, em 2021, de R$ 40,6 bilhões, e em 2022, de R$ 26 bilhões.
No caso do Mirante do Gavião Lodge, empreendimento hoteleiro localizado no município de Novo Airão (AM), o hotel já registra baixa nas reservas até o primeiro bimestre de 2024. “As imagens da grande seca estão por todos os lugares, levando hóspedes a terem medo de fazer cotações. Os que já têm reservas querem remarcar para a época da cheia, de março a setembro. Contudo, a estiagem nos afeta diretamente também nas operações das atividades e passeios, que tem o rio como principal via de acesso às atrações”, conta Ruy Carlos Tone, sócio-fundador do Mirante do Gavião Lodge.
“Outubro é um mês permeado de feriados, incluindo a semana da criança e, por sorte, grande parte dos clientes não desistiu. A taxa de reservas caiu apenas 20% se comparado a 2022”, revela Tone. “No entanto, a situação também afetou a demanda da alta temporada de verão no Brasil, com estimativa de que caia em 40% o número de reservas se a estiagem prevalecer. Felizmente, as chuvas estão voltando aos poucos e estamos tendo o cuidado de informar os visitantes acerca de atualizações sobre a logística na região, além de apoiar a Comunidade do Sobrado que solicitou a nossa ajuda”, complementa.
Guerras e conflitos políticos
No caso de confrontos armados, apesar de muito diferentes dos desastres naturais, o resultado é semelhante. O mais recente e polêmico de todos os conflitos foi a Guerra de Israel, que causou a suspensão de todas as operações da DMC Keli Tours e muitos outros empreendimentos turísticos. “A demanda em Israel caiu completamente e colegas de outros destinos do Oriente Médio relataram que também foram prejudicados. O impacto é grande, com viagens de grupos e viajantes individuais sendo adiadas, além de alguns cancelamentos”, conta Enio Stelmach, diretor de Marketing da Keli Tours.
“Ordenamos o retorno imediato dos passageiros que estavam a caminho de Israel aos seus respectivos países de origem. Quanto aos grupos e viajantes que estavam aqui, nos organizamos para seguirem a viagem de acordo com as possibilidades e segundo as instruções dos órgãos de segurança de Israel”, relata Stelmach.
Considerando o longo histórico de conflitos da região, o comportamento dos turistas no país é menos pessimista. “Muitos dos que tiveram suas viagens interrompidas querem voltar o mais breve possível a Israel, mas há cancelamentos também, embora sejam poucos. O público que vem a Israel, na sua maioria, tem noção do que os espera e não abre mão do nosso destino”, explica o diretor.
Seguro calamidade
Eventualidades decorrentes de desastres ambientais e conflitos políticos estão excluídas das condições gerais dos contratos de seguradoras. Isso quer dizer que as empresas não se responsabilizam por adversidades extremas, como terremotos e guerras. Ainda assim, algumas delas têm apoiado viajantes afetados, se adaptado de alguma forma ou até estão avaliando a possibilidade de incluir essas situações na cobertura.
É o caso da Coris, que ampliou o tempo de cobertura para viajantes impactados. “Nosso papel é tentar garantir o bem-estar do segurado, dando a ele toda a informação e assistência necessárias”, afirma Claudia Brito, sócia-diretora comercial e de Marketing da Coris. “No conflito iniciado em Israel, decidimos prorrogar as apólices por dez dias, para que os segurados impactados não ficassem desamparados até seu retorno ao Brasil. Abrimos inclusive nossa plataforma de atendimento para as pessoas sem nosso seguro, visto que nossa preocupação foi com a tranquilidade e segurança dos brasileiros”, conta.
A GTA também disponibilizou, gratuitamente, um voucher de prorrogação das apólices por dez dias para todos os segurados presentes em Israel durante o início do conflito. “Oferecemos esse serviço adicional na esperança de que o conflito termine ou que o viajante consiga retornar ao país de origem, sem imprevistos. Além disso, disponibilizamos cobertura psicológica para apoio aos turistas impactados no destino”, salienta Celso Guelfi, CEO e fundador da GTA.
A Coris ainda disponibiliza o contato com a central própria de atendimento ao viajante, que está disponível 24 horas por dia, sete dias por semana, segundo Claudia. “Esse canal permite aos turistas trazerem suas necessidades para que possamos buscar a melhor forma de prestar assistência e informação, inclusive acionamos nossa rede local de prestadores para trazer informações mais assertivas e seguras sobre a situação em Israel”, complementa a sócia-diretora.
Conforme se intensificam e aumentam os números de conflitos militares e desastres naturais, a demanda por um seguro viagem que cubra tais adversidades deve continuar aumentando. “Na época da pandemia, a GTA foi a primeira empresa a implementar cobertura para Covid-19, de forma paralela aos serviços normais. Para adversidades mais específicas, como terremotos e guerras, ainda estamos avaliando os riscos para desenvolver e precificar um possível serviço complementar”, finaliza Guelfi.
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