São Paulo (SP) – Durante sua apresentação na T&E Summit Finance Edition, evento promovido pela Paytrack, Oliver Stuenkel, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), trouxe à tona uma análise abrangente sobre as principais transformações geopolíticas que estão moldando o cenário econômico global. O palestrante destacou como a ascensão da Ásia, as tensões geopolíticas e as inovações tecnológicas, como a inteligência artificial, estão redefinindo o equilíbrio mundial.
Stuenkel iniciou sua fala no T&E Summit Finance abordando o impacto da globalização e como as últimas três décadas foram marcadas por uma interconexão sem precedentes. Segundo ele, esse período, iniciado nos anos 1990, foi caracterizado por uma paz relativa entre as grandes potências e por uma explosão no comércio internacional, o que impulsionou a criação de cadeias de suprimento complexas e eficientes. “Vimos uma redução dramática da pobreza e a ascensão de uma nova classe média em regiões como China, África e América Latina”, disse o professor.
Entretanto, o especialista foi categórico ao afirmar que esse cenário está mudando rapidamente. A intensificação dos conflitos geopolíticos e o surgimento de novas potências, como a China e a Índia, indicam que o mundo enfrenta desafios inéditos.
“Estamos retornando a uma era de maior competição entre grandes potências, e as empresas precisam estar preparadas para os impactos dessas mudanças. As tensões entre os Estados Unidos e a China, por exemplo, estão remodelando as relações comerciais e políticas globais”, pontuou.
Ascensão da Ásia e impacto no Brasil
Ainda durante seu painel no T&E Summit Finnance, Stuenkel destacou a importância da Ásia no futuro da economia global, afirmando que o deslocamento de poder para essa região apenas começou. “A China se tornou o principal parceiro comercial do Brasil em 2009, e a Índia desponta como a maior potência demográfica do mundo”, ressaltou. Ele também mencionou que, embora o Brasil tenha fortes laços comerciais com a Ásia, ainda há uma carência de profissionais capacitados para entender as dinâmicas políticas e econômicas desses países, o que limita as oportunidades de crescimento.
A ascensão da China e a crescente competição entre as superpotências, como Estados Unidos e China, estão moldando um cenário global mais instável. O palestrante ressalta que, diferentemente de um mundo unipolar dominado pelos EUA, a atual configuração apresenta múltiplos centros de poder, o que tem contribuído para crises, como o conflito entre Rússia e Ucrânia.
A China, ao alcançar um alto nível de competitividade, tanto no setor tecnológico quanto industrial, passou a ser vista como uma ameaça pelos EUA. Empresas chinesas, como Huawei, enfrentam bloqueios no mercado americano, principalmente por questões de segurança nacional.
“A nova Guerra Fria entre China e Estados Unidos não é apenas econômica, mas tecnológica”, afirma Stuenkel. Esse cenário força multinacionais a adaptarem suas cadeias de valor e a considerarem alternativas para evitar a dependência de apenas uma potência, como foi o caso da Apple, que transferiu parte de sua produção para a Índia.
No entanto, o especialista destaca um ponto positivo para a América Latina, especialmente para o Brasil. A região é vista como de baixo risco geopolítico, o que atrai investidores internacionais que desejam diversificar seus portfólios longe de áreas de conflito. “Enquanto o mundo enfrenta tensões, a América Latina, e em particular o Brasil, continua sendo uma região estável e atrativa para negócios”, disse ele. O Brasil tem se beneficiado dessa estabilidade, mantendo boas relações tanto com os EUA quanto com a China, o que permite ao país navegar com flexibilidade no cenário internacional.
Stuenkel mencionou ainda que, embora o Brasil precise lidar com as pressões das superpotências, ele tem conseguido adotar uma postura equilibrada. Um exemplo disso foi a decisão de criar uma rede de 5G para funcionários públicos sem o uso de tecnologia chinesa, enquanto o setor privado pôde manter essa opção. Isso demonstra a habilidade do Brasil em manter a neutralidade e preservar seus interesses econômicos.
O professor reforçou que as empresas brasileiras têm uma grande oportunidade de se destacar no cenário global, especialmente no contexto da transição para uma economia verde. “O Brasil pode se posicionar como um fornecedor chave de insumos para tecnologias sustentáveis, como baterias para carros elétricos, além de ser um destino atrativo para empresas que desejam reduzir sua pegada de carbono”, afirmou.
Desafios tecnológicos e o futuro do mercado de trabalho
Outro ponto de destaque foi a emergência da inteligência artificial (IA) como um dos maiores desafios e oportunidades da atualidade. “A IA representa a maior mudança desde a Revolução Industrial, mas sua implementação será muito mais rápida. Governos e empresas precisarão se adaptar rapidamente para lidar com as mudanças no mercado de trabalho e nas demandas sociais”, alertou Stuenkel durante T&E Summit Finance.
Ele utilizou o exemplo da Volkswagen, uma gigante do setor automotivo que, apesar de seu histórico de sucesso, enfrentou dificuldades com o surgimento dos carros elétricos. “A transição tecnológica será desafiadora, e nem todas as empresas estarão preparadas para ela”, frisou. Segundo Stuenkel, a capacidade de adaptação será crucial para o sucesso das organizações nos próximos anos.
Outro tópico abordado foi a questão das mudanças climáticas e seus impactos econômicos. Stuenkel ressaltou que o Brasil pode se destacar globalmente ao assumir um papel de liderança no combate às mudanças climáticas, ao invés de se isolar. Ele prevê que essas mudanças aumentarão os fluxos migratórios e forçarão países a adotarem políticas migratórias mais seletivas, impactando diretamente a dinâmica global de trabalho e produção.
“O Brasil tem a chance de se apresentar como parte da solução para os desafios climáticos globais, projetando-se como um ator chave na transição para uma economia mais sustentável”, argumentou.
Para o professor, as tensões geopolíticas, como a guerra na Ucrânia, podem atrasar a transição verde em alguns países, mas também abrem oportunidades para outros. Ele destacou no T&E Summit Finance que o Brasil, juntamente com o México, será um dos maiores produtores de petróleo em 2030, o que coloca o país em uma posição estratégica tanto para o futuro da energia renovável quanto para o mercado de combustíveis fósseis.
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