Brasileiros voltaram a gastar forte lá fora. Em 2024, as despesas em viagens internacionais somaram US$ 14,8 bilhões, maior patamar desde 2019, quando o total chegou a US$ 17,6 bilhões. Os dados, divulgados pelo Banco Central em janeiro de 2025, mostram um viajante mais confiante — e também mais exposto a deslizes na hora de voltar com a mala cheia. Portugal concentra 6,7% da preferência dos brasileiros, seguido por Argentina (5,7%), Paraguai (4,5%) e Estados Unidos (4,3%). Itália, França e Espanha também figuram entre os dez destinos mais buscados, segundo pesquisa da YouGov divulgada em dezembro de 2024.
Em destinos de compras como Milão, por exemplo, a atenção precisa ir além das diárias de hotel. Quem pesquisa onde ficar em Milão deve levar em conta também os limites da Receita Federal. A cidade, uma das principais capitais da moda, abriga o disputado Quadrilátero da Moda, com grifes como Prada, Gucci, Armani e Versace, e se firmou como polo global de consumo. Em 2024, a Via Monte Napoleone ultrapassou Nova York e Londres e foi apontada como a rua de compras mais cara do mundo, com aluguéis que chegam a 20 mil euros por metro quadrado ao ano, segundo a Cushman & Wakefield. Já a Via Torino concentra redes como Zara e H&M, com preços mais acessíveis.
Em grandes centros como Amsterdam — outro destino popular, que reúne museus, canais, vida noturna e uma vasta oferta de lazer —, estar bem informado faz diferença no orçamento. Quem busca onde se hospedar em Amsterdam precisa equilibrar gastos de hospedagem, passeios e compras dentro das regras da Receita para evitar surpresas na chegada ao Brasil.
Cotas da Receita Federal e limites para compras no exterior
A legislação brasileira define cotas de isenção que variam de acordo com o meio de transporte utilizado na chegada ao país. Para quem volta por via aérea ou marítima, o limite livre de imposto é de US$ 1 mil por pessoa, em vigor desde janeiro de 2022, quando a Portaria ME 15.224/2021 dobrou a antiga cota de US$ 500. Já quem entra por terra, rio ou lago tem cota de US$ 500.
Além disso, existe uma cota adicional específica para compras em free shop. No primeiro aeroporto de desembarque no Brasil, o viajante pode gastar mais US$ 1 mil em produtos nas lojas duty free. Em fronteiras terrestres, esse valor extra é de US$ 500 a cada período de 30 dias.
As isenções são individuais e intransferíveis: não é permitido somar cotas de familiares, nem mesmo entre pais e filhos menores. Menores de 18 anos também não podem incluir bebidas alcoólicas ou produtos de tabacaria em sua cota.
Há ainda limites quantitativos que independem do valor total das compras. Cada viajante (exceto menores) pode trazer no máximo:
12 litros de bebidas alcoólicas
10 maços de cigarros estrangeiros (200 unidades)
25 charutos ou cigarrilhas
250 gramas de fumo para cachimbo
Quantidade acima desses limites até pode ser aceita como bagagem, desde que o uso pessoal fique caracterizado e não haja intenção comercial. Mas, nesse caso, não há qualquer isenção: as mercadorias excedentes sempre serão tributadas, mesmo que o valor total não ultrapasse a cota de US$ 1 mil.
No caso de alimentos, são permitidos produtos industrializados e embalados, como queijos curados, carnes curadas, embutidos e bacalhau seco, em quantidades moderadas e com a documentação sanitária adequada. Sem o documento correto, os itens podem ser apreendidos, com aplicação de multa. Em situações específicas, a orientação é consultar as regras da Anvisa antes de embarcar.
Ultrapassou a cota? Entenda impostos, multas e declaração eletrônica
Quando o viajante ultrapassa os limites de isenção, entra em cena o Imposto de Importação. A alíquota é de 50% sobre o valor que exceder a cota. Se, além disso, houver omissão ou informação falsa na declaração, é aplicada uma multa adicional de 50% sobre o valor excedente.
Nesses casos, os bens ficam retidos até o pagamento do imposto e da multa. O prazo para quitar os valores é de 45 dias, por meio do Documento de Arrecadação de Receitas Federais (Darf). Só depois dessa etapa é possível retirar as mercadorias.
A declaração dos bens é feita pela internet, por meio da Declaração Eletrônica de Bens do Viajante (e-DBV). Em dezembro de 2024, a Receita Federal anunciou melhorias no sistema, que passou a permitir acesso pelo celular e preenchimento antecipado ainda durante o voo de retorno. O login pode ser feito com a conta Gov.br, o que agiliza o preenchimento dos dados pessoais. A declaração de produtos agropecuários e alimentos é obrigatória.
Também devem ser declarados valores em dinheiro em espécie, nacional ou estrangeiro, acima de R$ 10 mil. Itens sujeitos à fiscalização da Vigilância Sanitária, da Vigilância Agropecuária e do Exército seguem regras próprias e, em muitos casos, exigem autorização prévia.
Planejamento, câmbio e organização de notas fiscais
Na avaliação de Maria Fernanda Moro, fundadora da plataforma Viaja que Passa, o segredo está no planejamento. “Guardar notas fiscais e acompanhar o valor real das compras (incluindo impostos e conversão cambial) ajuda a evitar dores de cabeça no retorno ao Brasil.”
A especialista recomenda dividir o orçamento entre dinheiro em espécie, para gastos menores, e cartão para compras maiores, sempre atento às taxas de Iof e à variação cambial ao longo da viagem. No caso do tax free, a orientação é guardar todos os comprovantes e reservar tempo extra no aeroporto para os trâmites de reembolso.
Tax free na Europa: reembolso de impostos e épocas de liquidação
Para quem viaja à Europa com foco em compras, o sistema de tax free pode render uma boa economia. Em alguns países, é possível recuperar até 17,5% dos impostos embutidos nas mercadorias. As alíquotas variam: França reembolsa até 12%, Itália até 15%, Espanha até 15,3% e Holanda até 15%.
O passo a passo exige atenção. Na hora da compra, é preciso solicitar o formulário de tax free na loja e apresentar o passaporte. No aeroporto, antes do embarque de volta, o viajante deve validar os documentos na alfândega e, em seguida, buscar o guichê da empresa responsável pelo reembolso. O valor pode ser recebido em dinheiro na moeda local ou como crédito no cartão.
Quem quer aproveitar liquidações encontra boas oportunidades em dois períodos principais: janeiro e fevereiro concentram promoções de peças de outono e inverno; julho e agosto marcam o fim da coleção primavera-verão. Nesses meses, roupas, calçados e maquiagens de marcas de luxo entram em promoção.
Redes de fast fashion como Zara, H&M, Mango, Pull & Bear e Bershka, em geral, já praticam preços mais baixos que no Brasil ao longo do ano. Em lojas como a Primark, é possível encontrar calças jeans a partir de 10 euros, tênis por até 20 euros e vestidos até 15 euros, o que ajuda a montar um guarda-roupa completo gastando menos.
Outlets, brechós e luxo acessível nas principais capitais europeias
Os outlets europeus são outro atrativo para quem embarca em um roteiro de turismo de compras. Em muitos deles, descontos chegam a até 70% em marcas internacionais, de grifes de luxo a marcas esportivas. França e Reino Unido lideram esse segmento: próximo a Paris, o La Vallée Village reúne mais de cem lojas, com nomes como Chanel, Dior, Gucci e Louis Vuitton. Já nos arredores de Londres, o Bicester Village concentra marcas como Prada, Burberry, Gucci e Armani.
Na Itália, o The Mall, perto de Florença, é referência para quem busca peças de Gucci, Prada, Valentino e Dolce & Gabbana com preços mais atrativos. Próximo a Barcelona, o La Roca Village reúne marcas como Adidas, Lacoste, Chanel e Salvatore Ferragamo.
Holanda e Alemanha também têm papel de destaque. Na fronteira entre os dois países, o Designer Outlet Roermond oferece mais de 150 lojas, incluindo Prada e Gucci. A cerca de 45 minutos de Amsterdam, o Batavia Stad Fashion Outlet segue a mesma linha, com grandes marcas internacionais e descontos expressivos ao longo do ano.
Além dos grandes centros de compra, os brechós europeus ganham espaço entre viajantes que procuram luxo com preço mais acessível. Paris, Londres, Berlim, Milão, Barcelona e Amsterdam concentram lojas de segunda mão com peças vintage e itens de grifes renomadas, muitas vezes em excelente estado.
Em um cenário em que o brasileiro volta a gastar mais no exterior, conhecer e respeitar os limites da Receita, aproveitar o tax free e planejar as compras de forma estratégica é o caminho para transformar o turismo de compras em prazer — e não em dor de cabeça na chegada ao Brasil.







