Após um fim de semana marcado por cenas de exaustão, desorganização e longas filas no Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, o governo de Portugal anunciou um conjunto de medidas para reforçar o controle de fronteiras e tentar evitar a repetição do cenário durante os próximos períodos de alta demanda. As filas no controle de imigração chegaram a até nove horas, afetando principalmente passageiros provenientes de fora da União Europeia.
Entre as ações anunciadas está a ampliação das portas eletrônicas de controle de fronteira, conhecidas como e-gates, que passarão de 16 para 24 unidades. Além disso, o Conselho de Ministros aprovou um investimento de € 7,5 milhões — cerca de R$ 49 milhões — destinado à modernização dos sistemas de entrada e saída do Espaço Schengen ao longo dos próximos dois anos.
As portas eletrônicas são utilizadas por cidadãos do Espaço Schengen, além de países equiparados, como Suíça, Reino Unido e Noruega, e por viajantes com passaportes eletrônicos reconhecidos, caso de Estados Unidos, Canadá e Singapura. Passageiros de países como Brasil, Angola e Emirados Árabes Unidos continuam sujeitos à fila convencional, o que indica que as medidas devem reduzir parte da pressão, mas não eliminar totalmente os gargalos enfrentados por viajantes extracomunitários.
Segundo comunicado oficial, os recursos aprovados serão empregados na aquisição de hardware, software e serviços de manutenção corretiva associados ao novo Sistema de Entrada e Saída do Espaço Schengen. A Polícia de Segurança Pública (PSP), responsável pela supervisão das operações de fronteira, receberá os investimentos entre 2026 e 2028, com o objetivo de ampliar a capacidade operacional e melhorar a fluidez no principal aeroporto do país.
Filas extremas e relatos de abandono
No domingo (28), passageiros que desembarcaram em Lisboa enfrentaram um dos episódios mais críticos já registrados no aeroporto. Relatos indicam esperas de até nove horas na imigração, tempo comparável à duração de um voo direto entre Brasil e Portugal. Vídeos divulgados nas redes sociais e enviados à imprensa mostram passageiros sentados no chão, famílias exaustas, bagagens espalhadas e ausência de informações claras por parte das autoridades.
A situação atingiu sobretudo viajantes de fora da União Europeia, incluindo brasileiros, mas também residentes legais em Portugal que retornavam ao país. Muitos afirmaram não ter recebido qualquer tipo de apoio, como água ou alimentação, durante a espera prolongada.
Conexões perdidas e prejuízos
O impacto das filas foi além do desconforto. Passageiros relataram a perda de voos de conexão e prejuízos financeiros significativos. Um casal brasileiro, que viajava de Viracopos, em São Paulo, para Roma com escala em Lisboa, perdeu o voo seguinte mesmo com uma conexão de três horas. Sem assistência, teve de arcar com hospedagem e novas passagens.
Outro caso é o do paulista Willian Sousa, residente em Lisboa há cinco anos e portador de cartão de residência, que permaneceu nove horas na fila de imigração. Em vídeos enviados à imprensa, ele mostra malas abandonadas e filas que avançavam lentamente, sem qualquer orientação oficial.
Novo sistema europeu amplia tempo de atendimento
Um dos fatores apontados para o agravamento das filas é a implementação do novo sistema europeu de controle de fronteiras para cidadãos extracomunitários, em vigor desde 12 de outubro em Portugal e nos demais países do Espaço Schengen. A partir de 10 de dezembro, o sistema entrou em sua segunda fase, passando a exigir coleta de dados biométricos, como fotografia e impressões digitais.
Com o novo procedimento, cada atendimento passou a demandar mais tempo, e o aeroporto não conseguiu se adaptar de forma imediata à nova dinâmica operacional.
Falhas técnicas e inspeção da Comissão Europeia
Em 16 de dezembro, a PSP reconheceu a ocorrência de uma falha técnica nos sistemas de controle de fronteiras, que naquele dia provocou filas de até três horas. Desde então, passageiros relatam que os tempos de espera continuaram aumentando.
Entre os dias 15 e 17 de dezembro, especialistas enviados pela Comissão Europeia realizaram uma inspeção nos aeroportos de Lisboa e do Porto. A avaliação incluiu sistemas informáticos, como o Sistema de Informação Schengen, procedimentos operacionais, recursos humanos e a formação dos agentes responsáveis pelo controle de fronteiras.
Governo admite problemas e reforça efetivo
Diante da repercussão negativa, o governo português reconheceu publicamente a gravidade da situação. O secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Espírito Santo, classificou o controle de fronteiras no aeroporto como um “embaraço” e afirmou que, no momento, a única resposta possível era pedir desculpas aos passageiros.
Já a ministra da Administração Interna, Maria Lúcia Amaral, admitiu falhas técnicas e humanas e anunciou o reforço de 80 agentes da PSP no Aeroporto Humberto Delgado. Segundo ela, 50 agentes iniciaram as atividades na sexta-feira (26), enquanto outros 30 devem integrar a equipe nos próximos dias.
Atualmente, o aeroporto conta com 236 agentes da PSP, embora a necessidade estimada seja de 270 profissionais. O governo ressalta que a formação específica exigida para o controle de fronteiras, ministrada pela agência europeia Frontex, limita uma solução imediata.
Recomendações aos viajantes
Com o aumento do fluxo de passageiros no período de fim de ano, as autoridades admitem que os próximos dias serão desafiadores. Enquanto as medidas anunciadas não produzem efeito prático, passageiros que viajam para Portugal — especialmente oriundos de fora da União Europeia — devem se preparar para longas esperas, levar água e alimentos e evitar conexões curtas em Lisboa.

