Havia um tabu no turismo que impedia produtos e serviços de alto luxo serem temáticos. No caso da gastronomia, um estabelecimento poderia ter uma especialidade, como por exemplo, culinária japonesa, mas jamais se apresentar como um restaurante temático japonês, uma vez que poderia passar a impressão de algo folclórico e caricato.

Aqui vale uma nota: não há problema algum com empreendimentos temáticos. Muito pelo contrário, não só podem ser de excepcional qualidade, mas também muito lucrativos. O melhor exemplo são os parques de Orlando que funcionam muito bem, seduzindo diferentes gerações. Eu mesmo sou um apaixonado por eles. São cases de marketing. Exemplos bem-sucedidos de destinos que inspiram diferentes públicos. Fazem sucesso com turistas de todas as idades, classes sociais, culturas e crenças. O mesmo ocorre com a marca Hard Rock Café. Expressam magia e se tornam verdadeiros templos para os aficionados por música, rock em particular.

Tal fenômeno, no entanto, era impensável quando falávamos dos hotéis mais luxuosos do planeta. Eles poderiam trazer nos seus serviços e na sua decoração elementos culturais locais, mas jamais adotavam qualquer elemento temático. Até pouco tempo empreendimentos hoteleiros temáticos faziam parte essencialmente de redes internacionais, voltados para o polo econômico ou midlescale

Mas parece que tal olhar tem mudado. Talvez por conta da aproximação de grandes marcas hoteleiras e grifes de alta costura. É claro que um fashion designer, ao pensar em um tema de uma coleção, trabalhará códigos e fará releituras estéticas. Jamais vai replicar na passarela, qualquer tema, de forma óbvia.

Um caso emblemático é a marca Caudalie que soube se apropriar do enoturismo de forma elegante, bem refletida, nada convencional. A ponto de expandir seu portifólio, investindo em cosméticos e, hoje, se apresentando como um estilo de vida. Nada de chalés em forma de barrica. Tampouco uvas de resina decorando os ambientes. O hóspede se sente experiência do vinho sem parecer estar na Festa da Uva.

Chamou-me, do mesmo modo, a atenção um hotel no Sul da França, na região da Provence: o Hotel du Castellet. Trata-se de um empreendimento exclusivo, com apenas 43 quartos e suítes e 7 vilas, com a chancela Relais&Châteaux, e que pela sua própria história e localização não poderia deixar de expressar sua íntima ligação com a Fórmula 1.

Situado a poucos metros do circuito de Paul Ricard, o Castellet, foi criado justamente para receber os grandes pilotos, os proprietários das escuderias e os afortunados que nunca perdiam uma corrida pelo mundo. Seu fundador circulava entre os boxes, sempre chamando por apelidos ou pelo primeiro nome os famosos “ases dos volantes”. Hoje, o hotel é administrado pela sua ex-esposa.

Paul Ricard não faz mais parte do calendário da F1. No entanto, apaixonados por corridas não deixam de frequentar o sofisticadíssimo hotel. Seus hóspedes têm acesso privilegiado às dependências e experiências do autódromo. Lá são oferecidas corridas, inclusive para menores de idade, tudo acompanhado por instrutores rigorosos, é claro. Muitas mulheres são clientes. As que preferem não se aventurar nas corridas, podem usufruir um dos spas mais badalados da região, assim como os homens que tampouco se aventuram nas pistas onde correu gente como Lewis Hamilton, Schumacher ou Ayrton Senna.

Aliás o grande rival de Senna, Alain Prost pode ser visto no hotel. Uma elegantíssima loja, no hall do hotel, com roupas masculinas, femininas, acessórios de corrida e livros de Fórmula 1 pertence ao filho do piloto. Nos restaurantes e bares, de forma discreta porém emocionante, é possível ver registros dos grandes momentos das corridas na França. Mas não apenas um tema sustenta um empreendimento na indústria da hospitalidade. Infra-estrutura e muitos, muitos serviços, mesmo, são necessários. Daí que lá oferecem também diferentes esportes como o golf e uma experiência gastronômica estrelada. E o staff, com alguns brasileiros. Aliás, nós figuramos entre as nacionalidades mais importantes do hotel. Hotel du Chatellet virou em si um destino.

Soube recentemente que a BLTA-Brazilian Luxury Travel Association vai abrir inscrições para novos associados. O objetivo é unir forças para atrair mais turistas endinheirados para conhecer o turismo de luxo nacional. Poucos são os estrangeiros que vêm ao Brasil que não por negócios. A grande parte dos poucos visitantes cuja motivação é lazer ficam em hotéis de grandes redes internacionais. Temos hotéis nacionais que dizem representar o lifestyle brasileiro. Mas, na maior parte dos casos, com honrosas exceções, é apenas um verniz.

Obviamente ninguém espera ver recepcionistas vestidos de Zé Carioca e hostess de restaurantes como passistas de escola de samba. Até porque o Brasil é muito maior que o Rio. Há diferentes expressões culturais e genuinamente brasileiras no Nordeste, no Norte, no Centro Oeste, no Sudeste e mesmo no Sul. Obras de arte, culinária revisitada, músicas ajudam a ressaltar nossa identidade. Tem algo menos Brasil que minimalismo? Somos o país do maximalismo, da cor, do exagero. Do brilho que, no final das contas, fica chique.

Terno branco é absolutamente essencial em muitas partes do Brasil. E nada a ver com religião de matriz africana. É calor mesmo.

Mas fica a dúvida: será que conseguimos traduzir a nossa história, raízes, cultura, estética e valores de forma elegante em nossa hotelaria? Não é a primeira vez que faço essa provocação e nem será a última.