Com 17 anos de atuação na FecomercioSP, Guilherme Dietze ocupa atualmente o cargo de presidente do Conselho de Turismo da entidade, além de ser assessor econômico responsável por análises estratégicas sobre o comportamento do comércio e dos consumidores. Graduado em Economia pela Universidade de Vila Velha (UVV), no Espírito Santo, Dietze possui especialização em pesquisa de mercado pela FIPE/USP. Sua trajetória inclui ainda o papel de consultor econômico da Fecomércio-BA e de conselheiro suplente no Conselho Regional de Economia de São Paulo (Corecon-SP), onde coordena o Grupo de Trabalho dos Jovens Economistas
Dietze compartilha sua análise sobre o recente aumento do IOF e suas implicações para o setor de Turismo. O analista aborda desde os impactos diretos no bolso do consumidor até as articulações institucionais da FecomercioSP para mitigar os efeitos dessa medida. Com sua experiência e conhecimento, Dietze oferece uma perspectiva abrangente sobre os desafios e oportunidades que se apresentam para a indústria turística. Confira!
Como é que você avalia exatamente essa alta do IOF e como ela impacta o setor de serviços, especialmente o Turismo?
De forma geral, qualquer aumento de imposto já é, por si só, negativo. Nesse caso, a medida tem caráter puramente arrecadatório, o que torna ainda mais preocupante. No setor de Turismo, isso pesa duplamente: primeiro, porque o custo direto da viagem aumenta, como no caso da compra de moeda estrangeira, que saltou de 1,1% para 3,5%; segundo, porque esse tipo de medida aumenta a incerteza, pressionando o câmbio.
A viagem internacional, portanto, acaba ficando mais cara e menos previsível — o que é péssimo para um setor que depende de planejamento familiar e segurança financeira. E não há nenhuma compensação atrelada à medida, o que só reforça seu impacto negativo tanto para a economia como para o Turismo.
Existe algum viés positivo nessa medida?
Sendo bem honesto, acho difícil. O aumento do IOF pode até influenciar uma ou outra família a reconsiderar uma viagem ao exterior, mas, no geral, as pessoas seguem viajando e só vão pagar mais caro. A maior parte dos gastos com viagens internacionais ocorre no Brasil mesmo: aéreo, hospedagem via operadoras, agências.
O IOF atinge o restante, o que é relevante, mas não suficiente para fazer alguém desistir da viagem. O que realmente freia a demanda internacional é a imprevisibilidade cambial, e não o imposto isolado. Mesmo que exista algum viés positivo para o Turismo nacional, ele é muito pequeno e totalmente sobreposto pelos efeitos negativos da medida.
Essa medida afeta a competitividade das empresas brasileiras frente a players internacionais?
Não vejo dessa forma. O impacto maior é no custo para o consumidor final, especialmente na hora de fechar o câmbio ou de contratar serviços internacionais. Boa parte das viagens ainda é contratada por meio de agências e operadoras locais, com pagamentos em reais e parcelados, o que dilui esse efeito na competitividade direta.
O problema está no aumento de custo de transação, que encarece o pacote total. Mas não é como um aumento de tarifa aérea ou de hotel, que o consumidor entende como parte do serviço. Aqui, é só um imposto a mais, para o governo arrecadar, sem retorno. Isso atrapalha o ambiente de negócios como um todo, mas não coloca, necessariamente, as empresas nacionais em desvantagem direta com as internacionais.
Você acha que ainda há margem para uma nova revisão dessa política fiscal?
Sem dúvida. A reação do Congresso foi forte, inclusive com manifestações públicas de parlamentares que questionaram tanto o mérito quanto a forma como a medida foi tomada: sem debate prévio e com justificativas puramente arrecadatórias. E, dentro do próprio Executivo, há vozes dissonantes em relação à decisão.
O setor de Turismo, por sua vez, tem se posicionado de forma clara e coesa, o que fortalece o pleito por revisão. A pressão política tende a crescer, sobretudo se os efeitos começarem a ser sentidos na queda de viagens internacionais ou na desaceleração de vendas por parte das agências. Então, sim: o cenário ainda é instável, e há espaço para recuo ou ajuste dessa tributação nos próximos meses.
Como você imagina alternativas para mitigar os efeitos desse aumento?
O mercado já começa a buscar alternativas para reduzir o impacto. Uma delas, infelizmente, é o aumento da informalidade, como a troca de moeda entre pessoas físicas, fora do sistema oficial, justamente para evitar o pagamento do IOF. Isso é preocupante porque tira transações do controle fiscal e gera riscos para o consumidor.
Por outro lado, também há estratégias legais que podem ajudar o viajante a planejar melhor. Um bom exemplo é a compra antecipada de serviços ainda no Brasil, com a viagem “fechada” em real, seja por meio de operadoras, agências ou plataformas que ofereçam essa possibilidade. Também é possível equilibrar a forma de levar dinheiro: uma combinação de moeda em espécie, cartão pré-pago e crédito pode ser vantajosa dependendo do destino. E o uso de ferramentas que permitem travar o câmbio, como contas digitais e fintechs, ajuda a reduzir a exposição à volatilidade cambial e ao aumento de impostos. O planejamento passou a ser ainda mais essencial.
Também é possível que vejamos um leve redirecionamento para destinos mais acessíveis ou que permitam maior flexibilidade orçamentária. O brasileiro não vai deixar de viajar, mas vai fazer isso com mais planejamento, buscando evitar surpresas no retorno.
Essa movimentação pode refletir também nas operadoras e agências?
Sim, e de forma bastante direta. As operadoras e agências passam a ter um papel ainda mais relevante no suporte ao viajante. Elas precisam estar preparadas para oferecer não só bons pacotes, mas também orientação clara sobre as formas mais vantajosas de pagamento.
Em muitos casos, vão precisar rever suas estratégias de precificação, renegociar com fornecedores internacionais e buscar soluções que permitam manter a competitividade sem comprometer a margem. Além disso, acredito que haverá uma valorização das agências que oferecem assessoria completa — da parte cambial à financeira —, ajudando o cliente a tomar a melhor decisão. O papel consultivo ganha ainda mais força nesse cenário.
A Fecomércio-SP está atuando institucionalmente nesse debate?
A Fecomércio, por meio da CNC, divulgou uma nota junto com outras confederações, criticando o aumento do IOF. Acho que foi importante esse peso do empresariado brasileiro para exercer essa pressão. A gente vem sempre alertando sobre a necessidade de ritmo na produção.
Quando falamos de economia, o Turismo está envolvido também. E, nesse sentido, temos enfatizado que o governo deve melhorar suas contas e fazer um equilíbrio fiscal correto e isso certamente impacta na melhora do câmbio, reduz o custo da viagem ao exterior e ajuda na redução dos juros, o que também melhora o crédito para as famílias. Então, o trabalho institucional está muito focado nessa melhora do ambiente econômico, com reflexos diretos no setor de turismo.
O IOF altera sua perspectiva econômica para 2025?
Não altera. Como eu coloquei lá no Lacte 20 e reforcei em outras apresentações, você tem um primeiro semestre ainda carregado do bom momento que vivemos em 2024 e um segundo semestre que promete ser bem mais frio — ou seja, de arrefecimento. Essa ainda é a cabeça do ano.
O IOF tem, sim, impacto em fundos de investimento e transações internacionais, mas não é um fator decisório para mudar o status do turista que vai ao exterior. Tampouco vai alterar a dinâmica da nossa economia ou do turismo aqui dentro. Ele é um fator de impacto, mas não a ponto de reescrever as projeções macroeconômicas para 2025.